Psicodélico: agosto 2010

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Trailer do Documentário : Cortina de Fumaça !

Cortina de Fumaça é um projeto totalmente independente que está aguardando resultado para seleção do Festival de Cinema do Rio, quando certamente será exibido. Dá pra reconhecer de longe o teor de qualidade do filme de documentário que ouviu as melhores fontes oficiais possíveis e ainda contou com produção internacional! O trailer é ótimo e a última frase é perfeita: "para essa sociedade se curar vai ser preciso mais informação"!

http://www.cortinadefumaca.com/

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Drogas: cresce o movimento antiproibicionista




ENTREVISTA / Maurício Fiore



Depois de décadas de pouco ou nulo questionamento à atual política de drogas, cujo eixo é o proibicionismo e a repressão às substâncias psicoativas ilegais, começa a se estruturar no Brasil um movimento antiproibicionista alimentado pela pesquisa científica vinda da Academia e pelo ativismo a favor dos direitos humanos originado nas organizações da sociedade civil.

Para falar sobre o tema, o Comunidade Segura entrevistou Maurício Fiore, que dedica sua carreira à pesquisa sobre consumo de drogas e sobre o debate público das substâncias psicoativas.

Fiore é cientista social e antropólogo e faz parte do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (Neip), que acaba de publicar o livro "Drogas e cultura: novas perspectivas", no qual Fiore é autor do ensaio "Prazer e risco: uma discussão a respeito dos saberes médicos sobre o uso de drogas".

Nesta entrevista, Fiore fala sobre os efeitos do estagnação do debate, da monopolização do tema por parte da área médica e explica como esta situação começa a mudar graças à geração de conhecimento tanto no âmbito das ciências naturais, como no das ciências sociais.

Existe no mundo e no Brasil um movimento antiproibicionista consolidado?

Não sei se podemos dizer que já está consolidado, mas acredito que esse movimento existe e está tomando forma em nosso país. Em países desenvolvidos já está mais sólido e tem, inclusive, um apoio financeiro maior de fundações e de grandes nomes, como o de George Soros, entre outros.

Na última conferência mundial da ONU sobre o tema, cujo objetivo era rediscutir a atual política de drogas, houve um debate muito grande...

Eu não estive presente nessa conferência, mas, pelo que sei, as pessoas se articularam para protestar contra o proibicionismo. No entanto, o movimento não teve o impacto desejado e não tem força política suficiente para causar impacto nas convenções da ONU e ainda depende muito dos próprios Estados. Creio que o movimento cresce. Ainda falta que se consolide, mas eu sou otimista.

E no Brasil?

Está crescendo, mas ainda é incipiente. Está avançando em duas frentes: a Academia, a qual pertenço, e onde estão surgindo pesquisadores que começam a se posicionar contra a proibição – o Neip faz parte disso, e as organizações da sociedade civil, como a Psicotropicus, a Marcha da Maconha e o Viva Rio.

Mas a prova de que o debate é muito incipiente no Brasil é que, por exemplo, a Marcha da Maconha, que já é bastante forte no Rio de Janeiro e em outras cidades, em São Paulo foi proibida pela terceira vez consecutiva.

Esta é uma violação da liberdade de expressão do mesmo nível que ocorria durante a ditadura militar. Inclusive, países onde existe menos liberdade e problemas de democracia, como a Rússia, permitem a marcha. Isso mostra que no Brasil nem sequer se aceita o debate. O que quero enfatizar é que, independentemente de ser proibicionista ou antiproibicionista, o mais grave é não se aceitar o debate. Criminalizar o debate é algo muito sério.

Mas nós vemos pessoas da estatura do ex-ministro do Meio Ambiente ou do atual Ministro da Cultura debatendo abertamente o tema e sem preconceitos…

O debate político brasilero neste momento é muito débil. Pegue, por exemplo os dois principais candidatos à presidência e verá que nenhum deles contribui com o debate; nenhum deles admite que o tema tem que ser discutido, pelo contrário, pedem que haja um endurecimento das leis, e só o fazem porque é uma bandeira eleitoral que funciona.

Com certeza o ex-ministro Carlos Minc fez declarações importantes durante sua gestão, e o Ministério da Cultura, por exemplo, nos apoiou na publicação do livro “Drogas e cultura: novas perspectivas”. No entanto, por causa de suas declarações, Minc foi amplamente criticado pela classe política.

Até mesmo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso - que me parece que assumiu sua posição antiproibicionista de maneira um pouco tardia, mas assumiu - teve que enfrentar o bombardeio da oposição a seu partido e de muita gente em geral. Isto é, até que termine a campanha presidencial para as eleições de outubro, não vamos ouvir propostas, não vamos ver a abertura do debate: só mais repressão.

Quais são os principais obstáculos para romper esse conhecimento viciado da sociedade, para acabar com essa cegueira pelo debate?

Cada área tem coisas que atravancam. A área da saúde está muito marcada dentro da ideia de proibicionismo e de combate às drogas. Existem vozes importantes que questionam o status quo mas são poucas e, infelizmente, a maior parte dos recursos para pesquisa se destinam a esta área, que, na maioria das vezes, não se questiona, que não constroi um tema a partir da pesquisa e já começa qualquer estudo de maneira viciada, com o objetivo de combater as drogas. Na área acadêmica, acho que vamos ter que avançar muito, as ciências sociais podem contribuir muito.

Poderia explicar?

Hoje, falar de drogas é falar contra as drogas. Não se debate, não se questiona o que é o melhor para enfrentar o problema, a lógica da guerra é o principal obstáculo e é a que está liderando o debate. O debate na televisão é muito importante também, mas três minutos é pouco para abordar um tema tão complexo.

Perguntam, por exemplo, como enfrentar o problema das drogas e temos que responder uma pergunta que já vem viciada. Não há tempo para dizer que a maior parte dos consumidores não tem problemas com a maioria das drogas, que não serve de nada tentar exterminá-las, que essa questão do usuário de crack - essa figura do desestruturado que vemos nas ruas - também é uma generalização. Claro que é uma droga complexa e implica riscos, mas nem todos os que usam crack se transformam nesse tipo de personagem.

Com o proibicionismo e a guerra às drogas, parece que o mundo deu um passo adiante e dois atrás. Em seu relatório anual sobre drogas, a ONU mostrou que na Colômbia caiu a produção de coca, no entanto, a produção aumentou no Peru. O que fazer?

O tema da guerra foi estudado por muitos sociólogos e antropólogos. Descobriram que as sociedades que se acostumam à guerra acabam se formando em função desta e que chega um ponto em que a sociedade já não sabe viver mais sem guerra.

Con as drogas acontece o mesmo: muitos funcionários da ONU e dos governos precisam que a guerra contra as drogas continue. Existem países que são muito dependentes do modelo norte-americano - como Brasil e Colômbia - e um dos pontos que precisa ser atacado para quebrar o proibicionismo é mostrar que essa política de guerra é um fracasso. A forma de demonstrar isso é utilizando a mesma linguagem: os cultivos migram assim como as consequências da guerra às drogas, entre elas, a violência social.

Qual é a principal 'arma' para um contra-ataque ao proibicionismo?

Connhecimento, informação. As grandes apreensões de drogas que vemos, por exemplo, em São Paulo, resultam na prisão de um grupo de pessoas, mas o efeito é inócuo. A polícia capturou enormes quantidades de maconha, mas as pessoas não deixaram de fumar maconha. Alguns passaram a cultivá-la, outros passaram a usar outras drogas (por exemplo, o álcool), e outros, em uma fase de experimentação, migram para o crack que é mais barato, e também mais perigoso.

Quais são os efeitos do proibicionismo?

Existem dois tipos de consequências: intelectuais e sociais. Do ponto de vista intelectual, vemos uma estagnação, não há pesquisa de verdade para chegar ao conhecimento, há um conhecimento viciado. O discurso que impera é o discurso da área de saúde, o discurso médico. Não é que seja totalmente monolítico, existem muitas controvérsias, mas se apresenta como o único autorizado e qualifica de ideologia apologética todos as demais abordagens, pelo fato de que sua preocupação é o efeito das drogas. Isso é o que mais escuto dos proibicionistas, que nós não verificamos a realidade das coisas. Eu respondo que não, que o que fazemos é justamente mostrar a realidade.

Por acaso as agências de fomento se preocupam em financiar a pesquisa de quem está desconstruindo a questão e, de alguma forma, complexificando o tema? Claro que não, preferem patrocinar quem diz 'eu tenho a solução'. E isso, sim, é produção de ideologia, no sentido negativo do termo. O trabalho de campo em redução de danos enfrenta problemas de polícia hoje.

Temos o caso de uma pesquisadora do Neip que foi processada judicialmente porque fez uma pesquisa em que distribuía material de redução de danos em festas eletrônicas onde há consumo de MDMA (ecstasy), e um dos aspectos de sua pesquisa era colocar na Internet as informações que recolhia depois de cada evento.

Ela também distribuía folhetos em que dizia coisas como 'se você vai usar ecstasy pela primeira vez, tome só a metade'. Foi processada por apologia ao crime. Claro que ela não vai ser presa por isso, o processo não chega até ali, mas a orientadora da sua pesquisa foi suspensa da universidade.

Existe preconceito contra os pesquisadores do tema de drogas?

Sim, o pesquisador de drogas é 'um drogado', 'um viciado', 'um promotor das drogas'. Não se pode fazer uma tese sobre o tema sem ser tachado de drogado ou 'o das drogas'. Quando o pesquisador apresenta este tema na Academia, é como se isso não fosse ciência, como se não fosse geração de conhecimento, é como se fosse uma desculpa para defender a legalização das drogas ou para defender um direito próprio de usar drogas. Alguns bons professores que me orientavam diziam: 'isto aqui que você está pesquisando é para se justificar'. Essa é a principal consequência intelectual do proibicionismo, que a pesquisa enfrenta todo tipo de preconceitos.

domingo, 15 de agosto de 2010

Diálogo entre Aldous Huxley e Timothy Leary

Em 1960, um diálogo entre Aldous Huxley e Timothy Leary:
-...Todas essas drogas cerebrais produzidas em massa nos laborátórios provocarão mudanças enormes na sociedade. E isso vai acontecer independentemente de mim ou você. Tudo o que podemos fazer é espalhar a notícia. O maior obstáculo para a evolução, Timothy, é a Bíblia.

- Não me recordo de nenhuma discussão sobre drogas cerebrais na Bíblia.

- Você se esqueceu dos primeiros capítulos de Gênesis? Jeová disse para Adão e Eva : ‘Eu contruí esse refúgio maravilhoso a leste do Éden. Vocês podem fazer o que quiserem, exceto comer do fruto da árvore da Sabedoria’.

- Foi a primeira substância controlada.

- Exatamente. A Bíblia começa com uma lei antidrogas.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Maconha: entre liberdade de consumo e financiamento do tráfico

Artigo do leitor Sergio Vidal*

Segundo o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) publicado no último dia 23 de junho, 190 milhões de pessoas em todo o globo haviam fumado maconha ao menos uma vez na vida em 2008, número equivalente ao da população brasileira. Sendo a maconha a droga ilícita mais consumida, seus usuários são muitas vezes apontados como responsáveis por boa parte do financiamento do atual mercado, que em sua maioria tem forte relação com a criminalidade e com a violência.

" Não podemos continuar acreditando que não faz diferença se quem decide fumar maconha vai plantar em sua casa ou comprar numa boca de fumo "

Durante muitos anos, reproduzimos essa equação simplista sem maiores reflexões, recitando por aí o principal mantra do proibicionismo: "Os usuários são os principais responsáveis pelo financiamento da violência". Muitos devem lembrar que, em 2007, ano de lançamento do filme "Tropa de Elite", era comum ver Capitão Nascimento afirmando "Quem matou esse cara aqui foi você! É você que financia essa m...!" enquanto esbofeteava o maconheiro e era aplaudido pela plateia nos cinemas.

Mas será que essa afirmação é 100% verdadeira? Será que hoje em dia é assim tão fácil por a culpa nos usuários de maconha pela manutenção do poder econômico dos traficantes?

Já no relatório de 2006, a ONU chamava atenção para transformações que têm ocorrido no cenário do uso de maconha desde a década de 1960, como o uso de técnicas de cultivo com lâmpadas e o desenvolvimento de novos híbridos da planta, que possibilitaram a redescoberta da cultura. A ONU destaca que isso não tem apenas transformado o mercado fornecedor da erva, mas também possibilitado a muitos usuários cultivarem a maconha que consomem.

A partir do crescimento do uso da internet, especialmente com o lançamento do Growroom, grupo que atua em defesa dos usuários de maconha, os brasileiros passaram a ter acesso a essas informações. Desde então, temos visto o crescimento do número de usuários cultivadores acusados injustamente de tráfico, muitas vezes permanecendo um período encarcerados até terem a inocência comprovada.

O caso do baixista Pedro Caetano, da banda de reggae Ponto de Equilíbrio, preso com oito plantas e dez mudas na última quinta-feira , é mais um exemplo de como a lei vem sendo cumprida de forma abusiva e equivocada. Se por um lado o artigo 28 da lei 11.343 de 2006 determina que é vetada prisão nesses casos, vemos que o despreparo de policiais, delegados e outros operadores da lei ainda impede sua correta aplicação.

É óbvio que a maior parte dos usuários ainda compra, mas é cada vez maior o número de pessoas que buscam alternativas a esse circuito perverso. A sociedade brasileira precisa não apenas começar a perceber isso, mas estimular tal conduta. Já que em 2006 o Brasil retirou a pena de prisão para os usuários, não podemos continuar passando a mensagem de que não faz diferença se quem decide fumar maconha vai plantar em sua casa ou comprar numa boca de fumo.

No mínimo, a Lei 11.343 deve ser cumprida, e os usuários cultivadores não podem ser presos. Da forma como está hoje, estamos passando a mensagem de que o usuário que adquire tem que cumprir penas alternativas e que aquele cultiva deve ficar preso. Será mesmo que queremos fomentar uma sociedade na qual o Capitão Nascimento continuaria a ser aplaudido mesmo que desse tapas e xingasse um usuário que cultiva a maconha que consome?

*Sergio Vidal é antropólogo, escritor e trabalha no Growroom


segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Rick Simpson - Vença o câncer com cannabis e verdade




Rick Simpson - parte 1 - Vença o câncer com cannabis e verdade





Rick Simpson - parte 2 - Vença o câncer com cannabis e verdade






Rick Simpson - parte 3 - Vença o câncer com cannabis e verdade







Rick Simpson - parte 4 - Vença o câncer com cannabis e verdade








Rick Simpson - parte 5 - Vença o câncer com cannabis e verdade








Rick Simpson - parte 6 - Vença o câncer com cannabis e verdade







Rick Simpson - parte 7 - Vença o câncer com cannabis e verdade




quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Se o uso de drogas e o tráfico de drogas são tão ruins, por que não oferecemos algo melhor à juventude?

*** Revisto e modificado em 11/05/2010 e 28/05/2010. ***

Escolha o que consumir: você prefere comer lixo azedo ou um prato de arroz com feijão? Escolha como quer trabalhar: mergulhado até a cintura numa fossa séptica com risco de explosão ou limpinho e confortável numa sala refrigerada? Se as escolhas são tão óbvias, diga-me por que entre consumir uma substância tóxica que faz mal à saúde e consumir apenas alimentos saudáveis os jovens fazem uso de drogas. É porque são burros? Se as escolhas são tão óbvias, diga-me por que entre correr o risco de levar tiros ou ser preso e procurar um emprego honesto os jovens vendem drogas. É porque são maldosos? Ou será que as escolhas de consumir ou vender drogas não são tão óbvias assim e que na verdade a nossa sociedade é vergonhosamente incapaz de oferecer alternativas melhores para a juventude?

Pelo simples fato de você estar lendo este artigo há uma série de coisas que eu posso dizer a seu respeito. Você sabe ler, ou possui um leitor automático instalado no seu computador. Você tem acesso a um computador ligado à internet. Você tem tempo disponível para navegar pela blogosfera e ler um artigo sobre drogas. E você provavelmente não tem a menor idéia do que é nascer e crescer no ambiente de uma família desestruturada e disfuncional que mora em um barraco em um bairro miserável onde o Estado só se faz presente quando a polícia entra em confronto com alguém.

Dito de outra maneira, você não é um analfabeto miserável que nunca conheceu outra realidade exceto o abandono emocional, o completo descaso de todos com seu bem estar e a dura luta diária pela sobrevivência em meio a uma sociedade que idolatra o consumo e procura de todas as maneiras seduzir as pessoas a comprar os mais diversos bens, mostrando todo dia na TV que você é julgado pelo que tem e não pelo que é.

Eu já fui tão ignorante sobre a questão das drogas quanto qualquer um que nunca tenha vivido ou estudado a fundo a dinâmica social da drogadição e do tráfico, mas passei os últimos dez anos estudando o mundo das drogas para tentar compreender o que leva as pessoas a usar e a vender estas substâncias. O pequeno vislumbre que tive deste mundo nestes dez anos foi suficiente para me convencer que nem eu eu nem ninguém jamais conseguiria compreender integralmente o quanto tal ambiente pode moldar um ser humano a ele exposto desde o nacimento e por toda sua vida, muito menos tentar impor padrões morais e éticos a quem nasceu e cresceu mergulhado naquela realidade.

A vida da maioria dos usuários e comerciantes de drogas é muito mais dura e sombria do que a maioria imagina. Eles vivem em um mundo em que todos os caminhos levam à dor. As drogas são sua última oportunidade para aliviar seu sofrimento. Não é difícil deduzir como hão de reagir quando o governo e a sociedade, ao invés de buscar oferecer-lhes alternativas melhores, procuram negar-lhes até mesmo a última alternativa desesperada de que eles dispõem para tornar sua realidade suportável.

Quando eu leio algumas “mentes iluminadas” em fóruns da internet dizerem transbordando ódio9 e preconceito que “desigualdade social não gera criminalidade, ou todo pobre seria ladrão”, e que é necessário aumentar a repressão, investir em policiamento, construir mais presídios e asneiras do gênero, eu não sei se devo sentir pena de um ignorante ou nojo de um mal intencionado. Quem diz esse tipo de bobagem ou ignora completamente o assunto ou está defendendo uma postura ideológica na qual impera o desprezo pelo ser humano, somente se importando com seus próprios interesses. (Se você vestiu a carapuça, deveria tentar descobrir se precisa estudar mais sobre este assunto ou se deveria rever seus conceitos de ética e sua vida espiritual.)

Quando quem diz estas bobagens é um “especialista” na questão das drogas, eu não tenho dúvidas de que o sujeito só está jogando para a platéia, dizendo o que os ignorantes e os preconceituosos querem ouvir, para ser repercutido na mídia e valorizar o próprio passe. Ninguém que conheça realmente a dinâmica social do abuso de drogas e do tráfico de drogas apostaria um centavo sequer nestas alternativas, porque elas apenas pioram o problema que supostamente deveriam resolver.

Enxugar gelo

Quando alguém tem febre, tomar um anti-térmico proporciona um alívio temporário da febre. Se a causa da febre é uma infecção, porém, o anti-térmico irá apenas mascarar brevemente o problema, que logo em seguida retornará com maior gravidade. Insistir em tratar esta febre apenas com anti-térmicos não combaterá a infecção subjacente, exigirá quantidades cada vez maiores de anti-térmicos para segurar a febre e acabará por matar o paciente. Isso é exatamente o que a proibição e a repressão policial proporcionam no caso das drogas: um alívio temporário e enganador.

Qualquer aumento da repressão contra o abuso de drogas ou contra o tráfico de drogas irá apenas mascarar brevemente o problema, que logo em seguida retornará com maior gravidade. Foi isso que aconteceu na Lei Seca dos EUA, foi isso que aconteceu nos morros do Rio de Janeiro e é isso que está acontecendo no mundo inteiro.

Quanto maior a repressão, maior a violência com que atuarão as quadrilhas de tráfico. Assim como não existe um nível de anti-térmico capaz de debelar uma infecção, também não existe um nível de repressão capaz de debelar o abuso de drogas e o tráfico de drogas. Somente será possível enfrentar essa questão sem piorá-la através da eliminação das causas que levam as pessoas a abusarem de drogas e a venderem drogas. Isso é tão elementar que eu me impressiono que seja necessário repetir essa informação com freqüência e fico pasmo com a incapacidade de tanta gente compreender o óbvio.

A solução

Ao invés de querer obrigar os miseráveis a abrirem mão de sua última alternativa de fuga de uma realidade em que todo caminho os leva à dor, é necessário construir caminhos que os levem para longe da dor, em direção à segurança, ao conforto, ao bem-estar e à dignidade. Sim, é simples assim.

Enquanto houver desigualdade social ao ponto de haver quem precise lutar para sobreviver ao mesmo tempo que outros usufruem de luxos inatingíveis à maioria, continuará existindo forte estímulo econômico à criminalidade. A equação é realmente muito simples: se a sociedade planta diariamente na mente das pessoas desejos que não podem ser atingidos pelos caminhos legais, um certo percentual de otários permanecerá dócil para ser explorado e um certo percentual de inconformados se revoltará e buscará satisfazer esses desejos através de qualquer meio disponível.

Ou investimos pesadamente em qualidade de vida, segurança, conforto, bem-estar e dignidade para todos de fato, ou continuaremos estimulando a juventude despossuída a ingressar no caminho do crime, gerando violência que afeta a todos.

A objeção comum

“Ah, mas não é somente a desigualdade social que gera criminalidade, ou não haveria ricos que cometem crimes.”

Sim, corretíssimo. Existem outros fatores criminógenos, não tenho a menor dúvida. Se não fosse assim, o Congresso Nacional seria a instituição em que a população brasileira mais confia, porque todo deputado e senador recebe rendimentos mensais que chegam à casa das centenas de milhares ou até dos milhões de Reais. Se não fosse assim, não assistiríamos juízes desviando verbas, vendendo sentenças e até torturando crianças, como se viu recentemente nos noticiários.

Canalhas existem em todas as classes sociais, oriundos de todos os tipos de berço. Entretanto, se compararmos os índices de criminalidade de países como Noruega, Canadá, Holanda, Suécia, França, Japão, Finlândia, Dinamarca, Bélgica, Alemanha, Coréia do Sul e República Tcheca, que apresentam simultaneamente IDH > 0,9 e coeficiente, com os índices de criminalidade da maioria dos países que não atingem esses dois patamares, chegaremos forçosamente a uma de duas conclusões: ou existe uma imensa coincidência de “temperamento criminal” que envolve povos com as mais diferentes culturas e localizações geográficas, ou o desenvolvimento humano e a igualdade econômica realmente influenciam no nível de criminalidade. Faça sua escolha.

Conclusão

Você está sendo enganado pelas campanhas publicitárias que procuram “conscientizar” a população contra o uso de drogas e pelas iniciativas governamentais de “combate” às drogas. Tudo isso é fachada para manter as coisas como sempre estiveram.

O tráfico de drogas é apenas a fuga equivocada mais fácil e a atividade econômica mais lucrativa e que dá resultados mais rápidos – e portanto mais atraente para os miseráveis – entre inúmeras outras atividades ilícitas a que o indivíduo pode recorrer quando as atividades econômicas lícitas não estão disponíveis ou não são capazes de satisfazer de maneira digna suas necessidades básicas e os desejos que a sociedade de consumo dissemina através dos meios de comunicação de massa.

Nossa juventude não é burra nem mal intencionada, é abandonada, desassistida e está desesperada por inclusão em uma sociedade de consumo. Não é necessário fazer experimentos sócio-econômicos estúpidos como a revolução bolchevique ou a ditadura castrista para produzir uma sociedade mais justa e harmônica, os exemplos citados neste artigo são todos de países de economia livre e que são geridos segundo diversos sistemas de governo.

Eu não ficaria contente em apenas seguir o exemplo dos melhores do mundo, pois estes países também enfrentam seus problemas, mas eu consideraria isso um ótimo primeiro passo.

Arthur Golgo Lucas – www.arthur.bio.br – 08/05/2010

Leite de maconha é perfeito para crianças

Quem diz não sou eu: é um estadunidense que importa leite de maconha do Canadá, onde é produzido legalmente para consumo local e exportação devido a suas excelentes características nutricionais.

Segue a reportagem.

“Leite de maconha” ganha consumidores na América do Norte

“O hemp milk tem saído tão bem quanto o leite de soja, e pais me dizem que o sabor baunilha é perfeito para as crianças”, diz Marcus Amies, gerente da loja de produtos naturais Jimbos, num subúrbio de San Diego, Califórnia (EUA). O produto -um leite vegetal orgânico com leve sabor de nozes e rico em aminoácidos essenciais e ômega 3 e 6- teria tudo para atingir mercados mundiais de orgânicos, não fosse um detalhe: é feito a partir de Cannabis sativa L., a planta da maconha.

Após seis décadas de proibição no Canadá por seu uso recreativo, o cultivo comercial do cânhamo reiniciou-se em 1998.

Os EUA, que forçaram o vizinho à criminalização nos anos 1930, abocanham hoje 59% das exportações. Lá, o litro do leite de cânhamo custa US$ 4,99; a garrafa de 457 g de azeite, US$ 14,99; e barrinhas energéticas, US$ 2,29. No Brasil, os produtos não estão disponíveis.”

Nutrientes:

“Como sementes de outras plantas, a maconha tem constituintes nutritivos”, diz o psicofarmacologista Elisaldo Carlini, da Universidade Federal de São Paulo. Segundo ele, não há risco de sentir “barato” ao ingerir esses produtos.

“Nas sementes não se encontra quase nada de THC [tetrahidrocanabinol, sua molécula psicoativa]“, afirma.

A substância concentra-se na resina excretada pelas flores da planta fêmea, não usada nos alimentos. Ademais, o cânhamo industrial tem concentração de THC de 0,5%, contra mais de 5% da cepa usada para fins recreativos.

Seu óleo é rico em ácidos graxos essenciais – ômega 6 e ômega 3. Embora não sejam sintetizados pelo organismo, são necessários, por exemplo, para a transmissão de impulsos nervosos, síntese de hemoglobina e divisão celular.

“O que chama a atenção não é apenas a quantidade, mas sua proporção”, diz a nutricionista Samara Crancio, do Conselho Regional dos Nutricionistas de ES, MG e RJ.

O óleo do cânhamo apresenta uma razão de três partes de ômega 6 para uma de ômega 3 -dentro da ideal, entre 2:1 e 3:1, proposto por pesquisas, diz Crancio. “O mais próximo disso é o óleo de canola, mas o do cânhamo é melhor. Já uma razão muito elevada favoreceria o desenvolvimento de doenças alérgicas, cardiovasculares e inflamatórias.”

As proteínas da semente fazem dela uma boa opção vegetariana, segundo a nutricionista. “Poucos alimentos vegetais têm proteínas de alto valor biológico, e entre eles estão as sementes de soja e de cânhamo.”

Enquanto a soja é indicada especialmente para mulheres que entram na menopausa ou que precisam fazer reposição hormonal, por conta das isoflavonas – fitoesterol que “imita” o hormônio feminino estrogênio – o cânhamo é bom para pacientes com deficiência de ácidos graxos essenciais, crianças e atletas, diz Crancio.”

“Em 100 g de semente ainda estão presentes mais de 100% da recomendação diária de vitamina A e quase o suficiente de B1 e B2. Como sua produção não exige herbicidas nem fertilizantes, sua maior parte é certificada como orgânica, segundo o Departamento de Agricultura do Canadá.

Seria então o alimento perfeito? Ainda é cedo para dizê-lo. “Geralmente, alimentos têm componentes bons e ruins, e o importante é oferecer um que seja seguro. Ainda não encontrei estudos científicos que comprovem que essa semente seja livre de compostos antinutricionais”, diz Jocelem Salgado, professora de Nutrição Humana da Esalq-USP e presidente da Sociedade Brasileira de Alimentos Funcionais.”

Produto de exportação:

O negócio ainda é pequeno. Segundo a Aliança Comercial Canadense do Cânhamo, o mercado de qualquer nova variedade agrícola demora de 15 a 50 anos para se desenvolver. O cultivo legal do cânhamo mal alcançou uma década.

Ainda assim, as exportações vêm crescendo. Segundo o Departamento de Estatística canadense, o país exportou em 2007 US$ 2,1 milhões em sementes, comparados a US$ 1,3 milhão no ano anterior.

A americana Living Harvest produz o leite de cânhamo há dois anos e, nos próximos meses, lançará o sorvete Tempt. Como o cultivo é ilegal nos EUA, precisa importar toda a matéria-prima do Canadá. Já a Manitoba Harvest, que produz o leite Hemp Bliss, é canadense, mas exporta 65% de sua produção – 60% para os EUA.

Mike Fata, presidente da empresa, quer espalhar o leite pelo globo. “Estamos nos mudando para uma fábrica muito maior. [Vamos] aumentar nossa capacidade, dar conta da demanda norte-americana e expandir nossos mercados. Já entramos em contato com empresas no Brasil e vamos lançar produtos aí quando for a hora.”

Não será fácil. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) proíbe sua importação, seja como matéria-prima, seja como produto semi-elaborado ou seja como produto acabado, embora a semente já entre no Brasil em rações para aves da família dos psitacídeos (como papagaios).

Jocelem Salgado, que alimenta seus pássaros com esse tipo de ração, crê que as prateleiras brasileiras não receberão cedo os alimentos de cânhamo. “Nossa legislação é mais séria.”

Fonte: “Leite de maconha” ganha consumidores na América do Norte (www.educacaofisica.com.br)

Vejam como é absurdo o preconceito pelo último parágrafo da reportagem: até quem usa o produto cotidianamente sem problemas acha que o produto não deve entrar e elogia a legislação “séria” do Brasil. É um completo contra-senso, que mostra que o assunto é sempre tratado em termos preconceituosos e emocionais e não em termos técnicos e racionais.

Arthur Golgo Lucas – www.arthur.bio.br -28/04/2010

Saúde é argumento falso para proibição da maconha (Cannabis sativa)

Um dos argumentos preferidos dos proibicionistas é que “fumar maconha faz mal à saúde, logo deve ser proibido”. Isso confere uma aparência respeitável às pretensões de controle da privacidade do indivíduo pelo Estado, uma das idéias fundamentais do fascismo. Mas será que os proibicionistas estão mesmo interessados em promover a saúde e o bem-estar alheios?

Se os produtos A e B são perigosos, sendo que A é mais perigoso que B, qual deve ser proibido primeiro? O mais perigoso ou o menos perigoso?

Pois bem, então vamos comparar o número de mortes anuais causadas pela maconha e por outras causas de morte nos Estados Unidos:

Tabaco 435.000
Dieta pobre e inatividade física 365.000
Álcool 85.000
Agentes microbianos 75.000
Agentes tóxicos 55.000
Acidentes de automóvel 26.347
Reações adversas a medicamentos prescritos 32.000
Suicídio 30.622
Incidentes envolvendo armas de fogo 29.000
Homicídios 20.308
Comportamentos sexuais 20.000
Uso de todas as drogas ilícitas 17.000
Anti-Inflamatórios não esteroidais como Aspirina 7.600
Maconha 0

(Fonte: Drug War Facts.)

Uaaaaaaau, já posso ouvir a turba proibicionista enfurecida rosnando: “como é isso? A aspirina, o ibuprofeno, o naproxeno, o diclofenaco, o cetoprofeno e o ácido tiaprofênico matam sete mil e seiscentas pessoas por ano nos EUA, enquanto a Cannabis sativa mata zero pessoas por ano?! Vamos proibir a aspirina!!!”

[Pausa para imaginar a cena e absorver a idéia.]

Aliás, se o argumento de que “se algo faz mal à saúde, então deve ser proibido” fosse válido, que conclusões deveríamos tirar do fato de a má dieta e o sedentarismo matarem cerca de vinte e uma vezes mais que o consumo de todas as drogas ilícitas juntas?

Cadê os discursos indignados da turba proibicionista exigindo a criminalização do comércio e do consumo de salgadinhos gordurosos e o combate implacável às quadrilhas de fast-food?

[Pausa para cair a ficha do que significa alguma coisa matar vinte e uma vezes mais que o somatório de todas as drogas ilícitas sem que ninguém queira criminalizá-la.]

Eu sei que você já entendeu, mas eu faço questão de dizer explicitamente: se alguém exige a proibição e a criminalização do comércio e do uso de uma substância que nunca causou uma única morte mas ignora solenemente o comércio e o uso de diversas substâncias que matam milhares de pessoas todos os anos, é evidente que a motivação destas pessoas não é a preocupação com a saúde de quem quer que seja.

“Ah, mas a aspirina é um medicamento, serve para reduzir a dor, enquanto a maconha é usada para divertimento, não dá para comparar” - dirão os proibicionistas tentando manter a credibilidade de seu argumento.

A resposta tem duas partes.

1) A maconha pode salvar vidas e reduzir muito sofrimento.

Fumar maconha é a única coisa que consegue combater as terríveis náuseas provocadas pela quimioterapia em muitos pacientes com câncer ou leucemia. Nenhum outro medicamento consegue fazer o mesmo. Há inúmeros casos de pacientes que abandonaram a quimioterapia porque preferiram morrer de câncer a suportar o tratamento. Uns poucos baseados teriam salvo estas vidas e evitado muito sofrimento.

Fumar maconha é a única coisa que consegue combater a inapetência que acomete muitos pacientes com AIDS. Nenhum outro medicamento consegue fazer o mesmo. Muitos doentes definharam e morreram enfraquecidos pela falta de alimentação quando poderiam ter readquirido o prazer de comer estimulados pela larica (fome provocada pela maconha). Uns poucos baseados teriam salvo estas vidas e evitado muito sofrimento.

Os produtos derivados da Cannabis são úteis para uma série de outras condições clínicas, como no glaucoma, na dificuldade de absorção de proteínas e outras. Além disso, a maconha é uma excelente fonte de nutrientes, contém todos os aminoácidos essenciais e apresenta uma proporção perfeita entre os ácidos graxos ômega-3 e ômega-6, o que significa que a maconha pode ajudar a combater a desnutrição infantil e melhorar a qualidade nutricional da população em geral.

Uaaaaaaau, já posso ouvir a turba proibicionista animadíssima dizendo: “como é isso? A maconha é o único recurso que pode salvar inúmeras vidas, evitar que muitas pessoas fiquem cegas e garantir o desenvolvimento sadio do organismo das crianças, que são o futuro de nosso país? Vamos já produzir este recurso maravilhoso às toneladas!!!”

[Pausa para lembrar que os proibicionistas alegam preocupar-se com a saúde das pessoas.]

2) Sim, a maconha também é usada para propósitos recreativos. As novelas também. O futebol também. Os computadores também. Os videogames são produzidos especialmente para isso. Todos os brinquedos possuem esta finalidade, inclusive os didáticos.

Cadê os discursos indignados da turba proibicionista exigindo o banimento destas coisas todas porque servem para divertimento?

[Pausa para cair a ficha que divertimento não é um propósito ilícito nem tampouco recriminável.]

Tem mais uma coisinha que eu gostaria que todos lembrassem: mesmo quando aceitam a pesquisa científica para produzir medicamentos a partir da Cannabis sativa, o que é raro, os proibicionistas querem que as pessoas vão para a prisão por causa do comércio e do uso da maconha para propósitos recreativos.

As prisões brasileiras, como todo mundo sabe, são praticamente uma rede de SPAs cinco estrelas, onde os detentos possuem uma vida regrada, segura, distante das atribulações estressantes da vida urbana, em contato com a natureza, com alimentação saudável e uma rotina estimulante de estudos engrandecedores, atividades laborais produtivas e relações sociais harmônicas. Uma maravilha para a saúde. Muito melhor que fumar um bagulho com os amigos.

Conclusão óbvia: proibicionistas não estão interessados nem na saúde nem no bem estar de ninguém, isso é papo furado, é pura hipocrisia.

Arthur Golgo Lucas – www.arthur.bio.br – 01/09/2009

A Cannabis é o verdadeiro “bom-bril vegetal”: tem 1001 utilidades

A Cannabis sativa possui um imenso potencial econômico, medicinal e ambiental, podendo seu aproveitamento gerar riquezas, salvar vidas e preservar o ambiente. Reduzir o debate sobre a legalização da Cannabis sativa ao escopo da segurança é uma atitude de um reducionismo atroz que só interessa aos arautos do proibicionismo autoritário, cujo discurso moralista e repressor é em grande parte responsável pela geração da violência e da corrupção associadas ao tráfico de drogas.

A Cannabis pode ser usada:

- para produção de tecidos (as caravelas de Colombo transportavam toneladas de maconha na forma de fibras têxteis);

- para produção de celulose (é mais produtiva e menos agressiva ao ambiente que o eucalipto, o pinus e a acácia);

- para a produção de tábuas de compensado (suas fibras são mais resistentes e mais flexíveis que as da madeira);

- para propósitos medicinais (nada é tão eficaz para eliminar as náuseas de quimioterapia e para estimular o apetite de quem sofre de inapetência aidética);

- para forrageamento animal (coelhos por exemplo adoram maconha);

- para alimentação humana (especialmente as sementes). As sementes de maconha:

- possuem todos os aminoácidos e ácidos graxos essenciais;

- possuem 26% a 31% de proteína, sendo uma excelente fonte proteica;

- na forma de farinha possuem 6% de carboidratos, 5% a 10% de gorduras, 12% de fibra natural (contra míseros 3% a 4% da alface), 10% de umidade e 7% de resíduos minerais;

- possuem a globulina edestina, muito semelhante à contida no plasma humano, que contribui para a manutenção de um sistema imunlógico saudável;

- são o único alimento capaz de tratar com sucesso a doença consumptiva da tuberculose;

- possuem a maior percentagem de ácidos graxos não saturados entre as plantas usadas na alimentação humana (80%), superando até mesmo a linhaça (72%);

- são ricas em ácidos linolêico, linolênico, palmítico, esteárico, oleico e araquídico;

- reduzem o colesterol drasticamente se incluídas regularmente na dieta; – não dão “barato” porque não contém THC.

A Cannabis supera outras culturas em produtividade, não produz resíduos, não polui e tem aproveitamento integral. Ela pode ser extremamente útil e até mesmo salvar vidas.

Não é um absurdo ignorar esse fantástico recurso econômico e alimentar que poderia estar gerando renda, salvando vidas, combatendo a desnutrição e melhorando a saúde humana?

domingo, 1 de agosto de 2010

Proibições (Im)Possíveis? Um olhar sobre as Fronteiras Simbólicas entre Texto Jurídico e Concepções Religiosas

Proibições (Im)Possíveis?
Um olhar sobre as Fronteiras Simbólicas entre Texto Jurídico e Concepções Religiosas (1)

Alberto Groisman (2)
Universidade Federal de Santa Catarina
alberto@cfh.ufsc.br


“O misticismo é um assunto muito vasto. Isto se deve principalmente, ao
período de tempo em que tem atraído o pensamento humano, resultando
nas muitas diferentes interpretações que lhe se têm dadas. O misticismo
tem sido distorcido e deturpado para apoiar diferentes conceitos religiosos
e filosóficos. Mas, em si, o misticismo é um fio puro, independente das
diferentes tramas que o tempo nele tem produzido.”

Assim inicia uma das teses apresentadas ao XIV Congresso Nacional do Ministério Público
CONAMP – Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, ocorrido em Recife,
Pernambuco, em outubro de 2001. A tese foi aprovada pela Comissão Temática e rejeitada pela
Plenária.
Conforme seu sumário ela trata dos seguintes assuntos:

“O CHÁ DO SANTO DAIME. COMPONENTES FITO-QUÍMICOS DO CHÁ VEGETAL.
COLHEITA DA MATÉRIA-PRIMA. INGESTÃO DO CHÁ - REUNIÕES NOS CENTROS
VEGETAIS. OS EFEITOS DO DAIME NO ORGANISMO HUMANO. CENTROS
DAIMISTAS DOS ESTADOS BRASILEIROS E PAÍSES ADÉPTOS. CONSELHO
NACIONAL ANTIDROGA-CONAD. PROBLEMAS CONCRETOS PARA CRIANÇAS,
ADOLESCENTES E DOENTES MENTAIS. EXPLORAÇÃO DE RECURSOS FLORESTAIS
SEM CONTROLE DE MANEJO. O MINISTÉRIO PÚBLICO NO DESEMPENHO DE SUAS
FUNÇÕES INSTITUCIONAIS. VIDE TABELA DE FIGURAS. CONCLUSÕES.”

O que vou tentar fazer aqui é uma reflexão sobre o conteúdo desta tese como um exercício
de análise de textos e idéias jurídicas que abordam o uso de substâncias psicoativas por grupos
religiosos que as consideram sacramentos. Abordo neste trabalho também algumas fronteiras
simbólicas problemáticas estabelecidas entre as visões expressas em textos jurídicos como este e as concepções existentes no contexto do pensamento e das práticas destes grupos religiosos. Minha perspectiva é pensar, de um lado, os limites para estabelecer a posição e as ações do Estado na formulação de uma atitude normatizadora, de controle e proteção dos cidadãos. De outro, e pensando esta formulação, quero demonstrar que uma motivação de controle, que tenha como fim uma perspectiva genérica e generalizante, e que parte de princípio que este controle equivale à “proibição” legal, quando se coloca diante de concepções e princípios religiosos, pode constituir grandes dificuldades no campo da fruição das relações efetivas entre normas e práticas.

Tomo como base para a abordagem o caso do tratamento legal de situações problemáticas
associadas às chamadas religiões ayahuasqueiras brasileiras, como tem sido chamados os
agrupamentos religiosos conhecidos como Santo Daime , União do Vegetal e Barquinha. Por um
lado, em textos jurídicos como este, devo reconhecer, é possível notar indícios de uma busca de
sedimentar na base jurídico-legal as premissas negociadas em fóruns no âmbito de atuação do
Estado. Este procedimento parece tentar romper com um modelo reificador da experiência de
estados modificados de consciência. Neste sentido, no conteúdo deste procedimento é reconhecida a legitimidade da inserção e a especificidade destes estados de consciência no contexto religioso.

Entretanto, estes textos não conseguem transcender, a meu ver, a inspiração da chamada
“legislação anti-drogas”, que vê usuários como “vítimas”, “doentes”, crianças como objeto de
prejuízo, e seus pais como incapazes de julgar apropriadamente os “efeitos” que o uso destas
substâncias podem provocar. Uma perspectiva como esta implica na disseminação do princípio que estas pessoas fazem parte ou estão sujeitos a um contexto de incapacidade e cidadania relativa, com conseqüências significativas na atribuição de direitos e deveres.

Breve nota sobre a configuração do status legal do uso da Ayahuasca no Brasil

A adesão a um grupo religioso, e mais especificamente a um grupo que faz uso de uma
substância modificadora eventual de como percebemos o mundo, implica necessariamente na
formulação e expressão, implícita ou explícita, de modelos de ser. Estes modelos de ser no sentido mais classicamente associado ao pensamento de uma construção social da existência, passam por processos de negociação nos quais uma reconfiguração simbólica das expectativas quanto às percepções do aderente pode estar envolvidas. Quando esta negociação (ou seus desdobramentos) não chega a bom têrmo, ou seja, não produzem a fruição de uma inserção regular na sociedade, e quando esta falta de fruição ocasiona conflito, o Estado pode ser chamado a se pronunciar.

Tem sido de certa forma assim na história recente das relações entre o Estado e os
participantes das chamadas religiões ayahuasqueiras brasileiras. Neste sentido, são conhecidas na literatura pertinente até este momento pelo menos quatro denúncias apresentadas a autoridades federais - três delas assinadas e uma anônima. A oferta destas denúncias provocaram um posicionamento do Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) em 1992 - elaborado pelo conselheiro Domingos Bernardo Gialluisi da Silva Sá - sobre o uso ritual-religioso da ayahuasca, denominação genérica que identifica preparados derivados da utilização da planta psicoativa Banisteriopsis caapi.

Estas denúncias envolveram em última análise pais e filhos - jovens-maiores de idade - que
discordavam entre si sobre os projetos de vida que os filhos haviam adotado ao se associar a um
agrupamento religioso ayahuasqueiro (3).

Antecedente à formalização destas denúncias, uma ocorrência aparentemente provocada
por rotina de investigação desencadeou um olhar mais denso das autoridades. Esta ocorrência tem constado como o primeiro incidente policial que ocorre com grupos daimistas a partir do anos 80. Trata-se da prisão de uma pessoa, em 30 de setembro de 1981. Residente na Colonia Cinco Mil, pequena propriedade rural que abrigava uma sede de uma das correntes do Santo Daime, nos arredores de Rio Branco, a pessoa foi autuada e respondeu a processo judicial. Nos pertences desta pessoa, teria sido encontrada quantidade de "maconha" (cuja espécie mais conhecida é denominada Cannabis sativa), e cujo uso é atualmente proibido pela legislação brasileira. A partir desta prisão, no dia 1o. de outubro de 1981, a Polícia Federal se dirigiu à Colônia Cinco Mil e lá apreendeu pés, sementes e folhas do que os daimistas denominam Santa Maria, e cujo uso sacramental para eles transmutaria seus efeitos deletérios.

Segundo o relatório, “pode-se dizer, portanto que o “banisteriopsis caapi” entrou, posteriormente, na lista da DIMED, por causa da “maconha” que estava sendo usada, à época, na
Colônia Cinco Mil”. Aquela prisão então é que teria gerado as diligências policiais que se seguiram
em comunidades daimistas.

Um grupo de trabalho foi organizado para avaliar riscos e prejuízos nas práticas do grupo
religioso. Este grupo de trabalho foi designado pela Resolução/CONFEN no. 4, de 30 de julho de
1985, (...) com a finalidade de “examinar a questão da produção e consumo de substâncias drivadas de espécies vegetais” – Recomendações. Em suma, o CONFEN foi instado a manifestar-se sobre a inclusão, pela Portaria 02/85, da DIMED, da Banisteriopsis Caapi entre as drogas integrantes da lista de produtos proscritos. (...) petição dirigida ao presidente do CONFEN - Dr. Técio Lins e Silva (...). O pedido veio subscrito pelo advogado Luís Felipe Belmonte dos Santos, instruído com procuração que lhe outorgou o “Centro Espírita Beneficente União do Vegetal”. Diz o relatório final: “O fato sob exame tem suma importância posto que não pode o Grupo de Trabalho apurar, ao menos até o momento, um único registro, objetivamente comprovado, que levasse à demonstração inequívoca de prejuízos sociais causados (...), pelo uso da (...) ayahuasca” (fl.27). Foi esta posição do grupo de trabalho que permitiu até recentemente a existência consentida legalmente e as práticas de uso do Santo Daime, enquanto parte de um sistema religioso.

A tese referida acima procura descrever alguns aspectos das práticas e concepções
associadas pelo autor ao Santo Daime. Embora claramente voltada à busca de resguardar direitos e proteção de menores de idade diante de eventuais atos prejudiciais, de fato, as menções e
considerações feitas pelo autor demonstram, por suas lacunas e ausência de cuidado empírico, a
importância de construir relatos e descrições consistentes, fundamentadas em dados obtidos a
partir de coleta, organização e análise sistemáticas, aplicadas abordagens tanto quantitativas,
quanto qualitativas.

É possível notar já na descrição apresentada das sessões da “seita”, como o grupo é
definido pelo autor da tese, alegações que não resistem a uma simples e imediata observação
direta. Diz o texto:

“Nas reuniões dessa seita ou religião as pessoas se reúnem sob
orientação de um mestre-padrinho, este não ingere a bebida, fica sóbrio a
fim de conduzir a sessão e evitar que adeptos exagerem no
comportamento”.

É verdade que eventualmente, quase raramente, pessoas responsáveis por dirigir os ritos
daimistas tomam quantidade reduzida da bebida, mas esta descrição demonstra desconhecimento empírico de um dos princípios mais elementares dos grupos religiosos ayahuasqueiros, aquele que preconiza que nos rituais, todos devem tomar a bebida. Além disso, a expectativa sobre a atuação dos “padrinhos” daimistas ou dos “mestres” da UDV não tem como foco “evitar que adeptos exagerem no comportamento”, como se houvesse nos rituais do Santo Daime e da UDV um risco destacado de “exageros” por parte dos adeptos. Ao que parece, a motivação aqui é destacar a “exoticidade” e a possibilidade ostensiva de risco nas práticas rituais do grupo.

Além disso, o texto generaliza a forma daimista de servir a bebida, senão vejamos:

“O chá é distribuído em copos de vidro, geralmente, a mesma
vasilha é passada de mão em mão(...)”

Esta afirmação também não corresponde a uma observação empírica dos rituais dos grupos
ayahuasqueiros. No ritos do Santo Daime, por exemplo, duas filas são formadas - uma de mulheres e meninas, e outra de homens e rapazes - para tomar a bebida que é servida por pessoas especialmente indicadas para isso. Não há portanto a prática de “passar de mão em mão”. Já nos rituais da UDV, e inclusive em algumas igrejas daimistas, por exemplo, cada um toma a bebida em copo de uso individual, também servido por pessoa especialmente autorizada para isso.

Mais adiante, o autor afirma que, talvez inspirado pelo imaginário ocidental de um
“caldeirão bruxólico”, os adeptos tomariam a bebida “sempre ao redor de um tacho ou panelão
com o vinho vegetal, pois foi curtido ao fogo por longas duas a quatro horas”.

Por outro lado, o autor vai demonstrar que reflete sobre o fenômeno a partir de visões mais
recentes de como se deve encarar a experiência com drogas: no quesito “OS EFEITOS DO DAIME NO ORGANISMO HUMANO”, ele afirma: “Quanto aos efeitos, depende dos estado emocional do adépto, do ambiente, das pessoas que o cercam”, talvez reconhecendo e adaptando indiretamente a visão já clássica e muito difundida de Norman Zinberg, mas deixando de referenciá-la, que propõe considerar - para efetivamente analisar os efeitos de uma substância: que substância está sendo usada, o set (a pessoa que usa e seu estado no momento do uso), o setting (o contexto social, ambiental e simbólico em que é utilizada efetivamente a substância) (ZINBERG 1994).

Uma outra perspectiva problemática se apresenta quando o autor chama de “observação
cotidiana”, e que está descrita no quesito “PROBLEMAS CONCRETOS PARA CRIANÇAS,
ADOLESCENTES E DOENTES MENTAIS” de sua tese. Num primeiro relato ele se refere a um processo em curso na Justiça acreana:

”Pela observação cotidiana, verifica-se que alguns adolescentes, quando ingerem
a bebida ficam à mercê de violência ou abuso sexual, com o caso de uma jovem
indígena, de 12 anos de idade ter sido violentada sexualmente por um
missionário (grifo meu), que tinha plena consciência dos atos praticados e o
processo correu sob segredo de justiça na 2ª Vara Criminal de Rio Branco-
AC(Processo nº 001.94.001662-2), que está concluso para sentença.”

O relato do autor é sucinto e fragmentado e dá conta de "uma jovem indígena” e de um
“missionário”, sem entrar nos detalhes constituintes destas categorizações. Em primeiro lugar, a
denominação “indígena” não pode ser classificatória se considerarmos os diferentes grupos
indígenas existentes na região. De fato, ao examinar o resumo do processo no site da Justiça
acreana, nota-se que a “menina” tem ligações com um grupo Kaxinawá, e que a pessoa acusada do estupro seria um daimista, mas cuja denominação “missionário” sugere equívoco, já que não há esta categoria social classificatória no contexto das formulações do grupo. Ainda, não fica claro se o evento do estupro teria ocorrido no interior de uma comunidade daimista, e não fica claro se
ocorre em decorrência da ingestão da bebida. Mas uma idéia de impregnação parece estar implícita e implicada. Se o acusado se apresenta como daimista, então o que se depreende é que “estivesse sob o efeito do Santo Daime”. O que parece bastante discutível é associar automaticamente a provável auto-atribuição de "daimista" (que poderia ser abordada como uma forma conveniente de atribuir, e assim responsabilizar, a outrem por uma conduta imprópria) com uma atitude criminosa, já que a motivação para a qual o daimista é acusado pode envolver outros fatores pessoais não investigados.

Um outro relato feito pelo autor dá conta de um processo movido contra um menor que
matou um companheiro de trabalho sem motivo aparente. Nas palavras do autor: “processo que
passou pelo Juizado da Infância e Juventude - Rio Branco-AC, nº 001.99.004625-8, o qual já foi
sentenciado e o adolescente foi submetido à Medida de Segurança, incluindo aí as medidas
protetivas do art. 101, inciso V e VI do Estatuto Mirim, sendo encaminhado ao Hospital de Saúde
Mental do Acre(HOSMAC)”

Aqui é afirmado: “Aquele adolescente sob o efeito do daime, foi retirar lenha com um
companheiro, e sem motivos aparentes, pegou um facão que trazia no carrinho de mão e aplicou 37 terçadadas na vítima, tendo como conseqüência o óbito da mesma, foi amarrado no próprio centro daimista e entregue à Polícia.” E relata ainda: “Encaminhado para exame psiquiátrico relatou para o médico que escutou uma voz: “dizia pra mim acertar ele aí, acertei... dizia pra mim acertar que senão, eles ia me acertar lá na frente...”. E que após a consumação “a voz parou tudo”. Lógico (grifo meu), que a voz ouvida por aquele adolescente era o efeito da miração, visto que quando as pessoas envolvidas em colher qualquer material para a feitura do chá vegetal, ingerem o santo daime.“

As conclusões aqui colocadas podem até ter fundamentos em aspectos fatuais, entretanto,
não parece ser evidente, ou que se possa generalizar, que uma situação de conflito com uma
pessoa com problemas de saúde mental com agressão subseqüente, possa ser atribuída ao uso da
bebida como motivador particular.

O último caso relatado também parece muito pouco explorado pelo autor da tese. O texto
diz assim:

“Outro caso envolvendo adolescente, foi contado na escola onde o mesmo
freqüenta (Rio Branco-AC), dando conta de que toda vez que o pai comparecia
ao centro daimista, forçava o filho a tomar o chá, mesmo contra gosto do
infante, e mostrava o cinto, que estava na cintura, como forma de intimidar o
filho para que ele tomasse o chá vegetal e por isso se sentia mal.”

Sua última consideração neste item sugere mais uma vez desconhecimento:

“Existem centros, tanto em Rio Branco quanto na cidade de Boca do Acre-AM,
em que na hora das reuniões é servido o “santo daime” - chá vegetal, numa
bandeja (grifo meu) e em outra bandeja é servido “santa maria” - cigarro de
cannabys sativa, a fim de que os adéptos usem como quiserem.”

O uso do Daime e da Santa Maria podem fazer parte das práticas de grupos daimistas, mas
nenhuma destas substâncias - no contexto ritual genérico de seu uso - são "servidas em bandejas", que sugere um ambiente de “recreação” e “lazer”, o que ocorreria num estabelecimento comercial. Nos procedimentos rituais, os daimistas têm como princípio que aqueles que fazem os “despachos”, como são chamados os momentos em que os adeptos utilizam seus sacramentos no ritual, devem ser pessoas de experiência e conhecimento espiritual.

No desfecho da tese, o autor propõe como conclusões:

I - Há necessidade de recomendação ao Conselho Nacional Antidroga - Conad, a
fim de excepcionar a ingestão do chá denominado Ahyauasca, conhecido como
Santo Daime, a menores de 18 anos;
II - O Santo Daime é uma bebida alucenógena e por isso só deve ser utilizada em
rituais religiosos ou místicos, sendo vedado a retirada do chá vegetal para ser
ingerido fora daqueles ambientes;
III - Ainda não se tem confirmação de resultados científicos de cura aos
enfermos, nos rituais do chá oriundo da folha chacrona com o cipó jagube,
assim, se restringe a utilização por pessoas doentes mentais;
IV - O Ministério Público deve interceder junto ao Conselho Nacional Antidroga -
Conad, a fim de elaborar pesquisas nos vários centros de culto do Santo Daime,
com vistas à colheita de dados e fatos que atinjam à criança e adolescente, já
que esse campo é de ordem pública;
V - O Ministério Público é legitimado para propor Ação de Interdição ao
perturbado mental, que estiver fazendo uso do Santo Daime e isso traga riscos
para a saúde daquele indivíduo(arts. 1177, III, e 1178, do CPC);
VI - Caso o doente mental se restabeleça, o próprio Ministério Público tem
legitimidade “ad causam” para a Ação de Levantamento da Interdição(art. 1186,
do CPC), para restituição da capacidade do interditando reger sua própria pessoa
e administrar seus bens(art. 6º, 81 e 1.180, do CPC, c/c art. 8º, do C.C. e art. 32,
da Lei 8.625/93);
VII - Os Ministérios Públicos dos Estados, onde houver Centros Rituais do Santo
Daime, devem recomendar aos Padrinhos-Mestres Daimistas, para evitar ou
proibir o transporte do chá para ser ingerido fora do ambiente dos Centros
Vegetais.
VIII - Os Órgãos Ambientais, que atuam no Estado, devem recomendar e
incentivar os plantios racionais do cipó jagube e da folha chacrona, pelos centros
daimistas, a fim de evitar que a colheita dessa matéria-prima na floresta natural,
afete o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

As considerações finais do autor da tese, e assim suas propostas para a atuação da
autoridade pública - que se aprovadas tornar-se-íam diretivas das ações do Ministério Público a
nível nacional - demonstram que as prerrogativas legais e suas respectivas concretizações ao nível das relações sociais estão sujeitas em grande medida a preconceitos e abordagens manipuladas ou empiricamente inconsistentes.

O Estado Nacional, os Estados Modificados de Consciência e o Uso da Ayahuasca

Uma literatura bastante significativa vem descrevendo e discutindo – particularmente a
partir do anos 60 - questões envolvendo a relação entre o Estado Nacional e os Estados Modificados de Consciência. Este enfoque tem sido motivado principalmente por relações de conflito. Estas relações de conflito vem sendo estabelecidas num nível generalizado, e de motivação digamos “quantitativa”, de inspiração digamos "epidemiológica", por uma radicalização das iniciativas de diversos países, principalmente dos Estados Unidos, em formular políticas internacionais de repressão ao uso das chamadas “drogas ilícitas”.

Em outro nível, mais particular e qualitativo, a conjuntura é marcada por uma expansão dos
estudos e do conhecimento sobre implicações sociais, culturais e fármaco-bioquímicas da adoção
por grupos ou indivíduos de práticas de modificação de estados de consciência, como o transe induzido por técnicas rituais ou pelo uso de substâncias psicoativas. Eventualmente como
decorrência, às vezes como motivação de conflitos, juntam-se decorrências e cristalizações
legislativas e legais, de posicionamentos jurídicos, profissionais e político-profissionais. Estes
posicionamentos recortam idéias e procedimentos no sentido de estabelecer fronteiras do que é, e do que não é, ato criminal, a partir de critérios definidos a priori.

De fato, conflitos quando não ameaçam a integridade física e psíquica das pessoas podem
ser vistos como sinal de vitalidade. Entretanto a idéia da prevenção, que parece oriunda de uma
ideologia medicalizadora e epidemiológica da sociedade, fez com que o Estado - protagonista
histórico da mediação de conflitos estabelecidos - assumisse também o papel de mediador dos
conflitos por vir, promovendo e reforçando assim as abordagens do risco e do dano como
norteadoras das políticas públicas, não só as relativas à saúde, mas também aquelas que
estabelecem parâmetros para pensar a criminalidade e a educação.

Esta postura do Estado, que de fato significa uma modificação qualitativa, e talvez oportuna
no que tange à previsão de problemas de qualidade de vida futura, criou porém uma série da
necessidades e expectativas, e neste sentido, uma parte de seu caráter imprevisível e didático de
exigir dos protagonistas criatividade e desprendimento talvez esteja por ser perdida. Assim, todo e qualquer forma de conflito é previsto, equacionado e evitado a partir de políticas públicas.

Neste sentido, a discussão neste campo tanto de proibições “possíveis” e “impossíveis”,
sejam elas relativas ao uso de substâncias psicoativas ou não, implicam em pensar as políticas e os processos educativos instituídos e aceitos como resultado da formulação de modelos esperados de cidadão e assim, padronizadores de atitudes e práticas.

O uso religioso e ritual de diversas substâncias psicoativas – modificadoras intensivas e/ou
extensivas dos estados de consciência – em contextos urbanos, deu visibilidade a um fenômeno que antes estava restrito ao fluir da vida em comunidades remotas, indígenas e não-indígenas. O uso lúdico e contracultural do ácido lisérgico nos anos 60, o uso alternativo e curioso dos cogumelos alucinógenos principalmente do psylocibe nos anos 70, e a expansão de grupos religiosos usuários da ayahuasca, como o Santo Daime e a União do Vegetal nos anos 80, encontrou na mídia – e, particularmente nos relatos pessoais de encontro com o divino e cura – importantes elementos de disseminação e expansão, mas também de estímulo à perseguição e à repressão aos grupos usuários em diversos países. Na Holanda, na Alemanha, na Espanha, na França e nos Estados Unidos, no final dos anos 1990s, adeptos foram presos, processados, seu sacramento confiscado, muitas vezes em operações policiais violentas.

A base política desta repressão muito provavelmente foi a chamada “guerra anti-drogas”,
desencadeada pelo governo norte-americano nos anos 90, e que tem sido analisada como uma
expressão equivocada do que se poderia considerar uma intervenção qualitativa para combater o
uso de drogas ilícitas, desencadeando em alguns casos uma "caça às bruxas" sem antecedentes
recentes na história, por exemplo, da Europa.

Já a base do argumento desta repressão sugere uma elipse explicativa de exceções sobre o
que é droga, um raciocínio circular. Assim, e neste sentido, um dos argumentos mais
consistentemente estabilizados, no sentido de Polanyi (POLANYI 1979) afirma que a priori qualquer uso destas substâncias “faz mal à saúde” ou se “constitui em risco à saúde”.

Ponderações finais

Tentei aqui refletir sobre a tentativa de sistematizar e definir uma parte significativa da
elaboração jurídica que tem como fundamento propugnar a inexistência de direito ao uso de
substâncias psicoativas em qualquer contexto, e especificamente às formas com que esta
elaboração está sistematizada para o caso do Santo Daime na tese analisada.

Um aspecto central nesta definição é que existe uma espécie de roteiro, um fluxo cognitivo
delimitado simbolicamente pela divulgação diária e intensa de notícias e advertências. Este fluxo
associa a produção e consumo de quaisquer substâncias ao risco à saúde, e atribui à biomedicina
uma autoridade quase exclusiva para a abordagem "especializada" do assunto. Cabe ao fim e ao
cabo aos médicos, mas também a policiais e juristas, que num segundo plano estão supostamente
fundamentados na "opinião médica", a elaboração e a guarda dos preceitos, das práticas legais e do pensamento sobre risco e prejuízo do uso ou do abuso de substâncias e técnicas de modificação dos estados de consciência.

Podemos considerar preliminarmente que as relações de conflito e as atitudes que este
processo de sistematização engendram são estimuladas e informadas na presunção de
evidenciação e persuasão. Esta presunção não só preconiza o Estado como detentor único do poder de definição do que é socialmente relevante e perigoso, desprezando efetivamente outros papéis que o Estado poderia cumprir. Assim o que vemos nas disputas jurídicas é uma absorção de grande parte da energia dos interessados, entre eles os praticantes de técnicas que modificam os estados de consciência, entretanto sem mecanismos e recursos disponíveis de acúmulo do conhecimento e das experiências acionados nestes processos.

Como tem sido substancialmente analisado por vários pesquisadores, o uso da ayahuasca
em contextos rituais e/ou religiosos é cercada por um conjunto variado e complexo de
procedimentos e representações que fazem de seu uso uma fonte extraordinária de possibilidades evidenciadas, que tornam quase ridículas as tentativas de enquadrar este uso no usual simplismo de abordagem sobre as "drogas" não controladas por um modelo medicalizado.

Em duas ocasiões, entre os anos 1988 e em 1989, e posteriormente entre 1996 e 1999,
visitei por período longo como pesquisador centros do Santo Daime na Amazônia e na Europa.
Nestas ocasiões, depoimentos, narrativas e observações incidentais dos daimistas demonstraram
convicções genuínas que davam conta de uma elaboração disseminada amplamente entre os
daimistas de que o Santo Daime seria um manifestação material de força espiritual, ao mesmo
tempo muito sutil ou fina (no jargão nativo) e muito poderosa. Sim, é difícil enquadrar estas
convicções num regulamento jurídico, mas inverter a equação semântica, ignorando
completamente este generalizado e substantivo ponto de vista é no mínimo obscurantista.

A virtude está no meio? Talvez não. Não me parece que neste caso possamos pensar em
possibilidades de conciliação ou unificação de pontos de vista. Há um conflito de fundamentos que
pode ser ilustrado com os disseminadamente denunciados ouvidos moucos daqueles que não
querem ouvir as evidências, ou que ouvem somente aquelas que lhes interessam. Uma importante é que há um aspecto na modificação dos estados de consciência que implica diretamente na própria possibilidade de transformação "benéfica" do ser humano, amplamente reconhecida empiricamente pela literatura produzida contemporaneamente.

Para além de uma concepção divinizadora que atribui um caráter sacramental, uma parte
significativa dos participantes dos rituais do Santo Daime atribuem à bebida um papel educativo.
Muitos alegam que depois de tomarem a bebida nunca mais recorreram à agressão física para
educar. Esta problematiza de forma inquietante a proibição do uso da bebida para menores de 18
anos, acordada recentemente pelo Conselho Federal de Entorpecentes (4) com os grupos religiosos usuários da ayahuasca. Este aspecto educativo se configuraria tanto nos efeitos "visionários", que incluem o que os daimistas chamam de "peia", que em geral produz um processo de auto-crítica, como também se expressaria como síntese do investimento coletivo da constituição de comunidades de convivência, que no mínimo, poderíamos afirmar exigem condutas e comportamentos socialmente aceitos.

Neste sentido, o chamado uso ritual e/ou religioso implica em mais do que exclusivamente
promover insights religiosos. Se tomarmos como base o ponto de vista colocado por Marcel Mauss que as relações sociais são regidas por atitudes rituais, deveres morais e princípios de obrigação mútua, pelo, de sua parte Bronislaw Malinowski chamou de “vínculos cristalizados” (1978: 30), as práticas religiosas que se desenvolvem no interior de grupos circunscritos simbólica e socialmente, envolvem a submissão universal dos membros aos atos sacramentais, que são fundamentalmente sociais. Neste caso, o uso da substância reverbera potencialmente o próprio usufruto do dom recíproco com a comunidade e com o divino, de benefício ou vínculo espiritual. Neste sentido, querer que membros de um grupo circunscrito, sejam eles sacerdotes ou pais restrinjam o uso do sacramento, implica em desqualificar o próprio princípio da revelação, ou da ligação com o plano espiritual, fundamental à constituição social e cosmológica de um grupo religioso.

Por outro lado, o argumento do prejuízo à saúde no que tange às substâncias psicoativas
tem sido sustentado por um princípio pressuposto em investigações inspiradas por paradigmas biomédicos. Estas tomam como base as repercussões dos efeitos destas substâncias a partir de um uso individualizado e em condições laboratoriais. Assim, são considerados efeitos resultantes de uma administração contextualizada por ambientes específicos, muitas vêzes hospitalares, nos quais as condições de uso são controladas por variáveis profissionais unilaterais, e não por contextos de por exemplo auxílio mútuo e apoio espiritual, que poderíamos considerar "mais simétricos", encontrados nos contextos religiosos que pesquisei. Devo aqui me reportar mais uma vez a importantes anotações, como já disse "clássicas", como as feitas por Zinberg, em sua abordagem de proposição de uma compreensão mais densa dos efeitos do uso de psicoativos. Ou que se deve considerar sempre em pesquisa, três aspectos da experiência, a própria substância e seus efeitos, o set, que pode ser sintetizado como o estado, a condição e também a qualificação do sujeito para o uso da substância e o setting, o contexto amplo sócio-cultural e ambiental no qual se faz uso.

É claro que é preciso considerar que o caráter de prática religiosa implica no risco da
construção de uma justificativa conveniente para um eventual uso recreativo. Entretanto no caso
específico das substâncias derivadas da preparação da Banisteriopsis caapi, conhecida
genericamente como ayahuasca, a ingestão implica na expectativa de sensações pouco agradáveis, oriundas de suas propriedades eméticas e laxativas. Estes efeitos recebem dos grupos usuários uma abordagem doutrinária e litúrgica. São vistos como sendo momentos de desafio e limpeza espiritual, nos quais o adepto passa por prova e escrutínio de sua convicção e conduta.

Assim, ao pronunciar, legislar, proibir ou reprimir estas práticas religiosas a priori, ou tratálas
como ilegítimas, o Estado assume a responsabilidade de incorrer em ignorância e desprezo de
seus fundamentos, das evidências contextuais, ou do caráter de dádiva que a experiência ritual e
cotidiana que o uso destas substâncias assumem para os grupos usuários.

Por outro lado, e considerando as práticas educativas no interior destes grupos, minha
própria observação, tanto em comunidades remotas quanto situadas em regiões urbanas,
demonstrou que a recomendação ou prescrição parental do uso do daime aos filhos, estava inserida em método educativo e implicava muitas vezes na substituição de medidas autoritárias ou agressivas sancionadoras do comportamento.

Ainda, um agravante no debate sobre risco e prejuízo é que desprezamos completamente a
possibilidade de produção do risco a partir de mecanismos exclusivamente simbólicos. Assim como o risco, o prejuízo se existe é em última análise circunstancial. Estes só poderiam ser rigorosamente determinados a posteriori, considerando-se uma série finita, mas numerosa, de fatores sociais, culturais, pessoais, ambientais, que na medida em que se sobrepõem ou interagem no campo da experiência, produzem as situações consideradas "prejudiciais" à saúde da pessoa. Assim, muito mais do que um jogo enxadrístico de palavras no qual os peões são identificados pelos nomes de "usuários", o posicionamento do Estado perante não só a ingestão e o uso ritual-religioso de substâncias psicoativas, mas também em relação a todos as práticas e técnicas de modificação dos estados de percepção que podemos encontrar no planeta, implica em considerar uma abordagem que seja inspirada em inserir e articular a opinião do usuário, a substância utilizada, o estado pessoal do usuário, as implicações deste estado, o lugar ou contexto de utilização, e outros aspectos e circunstâncias relevantes.

É sempre problemático no Brasil abordar as formas como se configuram no nível do Estado
os resultados e desdobramentos dos processos sociais. Quando uma prática social ou uma relação
se torna assunto do Estado, tudo passa por intrincado jogo de reificação mediado por a prioris. Isto inibe avanços, e em muitos casos implica que uma conquista cognitiva, educativa, social e cultural, pode passar a ser "problema", ou de saúde ou de polícia.

Neste trabalho procurei apresentar e problematizar as iniciativas do Estado, e seus
desdobramentos no campo das negociações sociais, considerando que mais do que princípios, o
que está em jogo são, de um lado, os anseios morais, baseados em sistemas de idéias motivados
por obscurantismo e exclusão, e de outro, o atrelamento a modelos de controle, subordinados à
execução das agendas internacionais de outros países.

É nesta perspectiva que vejo o debate sobre o que se chama inadvertidamente de
“problema da droga” no Brasil. O discurso do Estado e da mídia caminha para a homogeneidade,
falar nas drogas e seus efeitos é sempre um “problema”, e sendo assim "urgência" a ser atendida
por "especialistas". Os usuários continuam a ser "doentes" ou "vítimas", e muitas vezes algozes.
Esta abordagem etnocêntrica implica que a legitimidade do uso está sempre sob júdice, e que a sua legalidade é uma concessão especial de um Estado "tolerante" ou impotente.

Notas :

1 Versão revisada do paper apresentado, em 2003, à V Reunião de Antropologia do Mercosul, Fórum Religión,
Estado y Justicia: Legalidad y legitimación religiosa en el Mercosur – Florianópolis.
2 Agradeço à Beatriz Labate por sua gentileza e sugestões.
3 Ver por exemplo, CASTILHA, Alicia (1995) Santo Daime: Fanatismo e Lavagem Cerebral. Rio: Imago.
4 Posteriormente à apresentação deste paper, esta norma foi suprimida.


Referências Bibliográficas:

GROISMAN, Alberto.
(1999). Eu Venho da Floresta: Um Estudo sobre o Contexto Simbólico do Uso do Santo Daime.
Florianópolis: EdUFSC.


GROISMAN, Alberto.
(2000). Santo Daime in the Netherlands: An Anthropological Study of a New World Religion in a
European Setting. Tese de Doutorado. Goldsmiths College, University of London.


MAUSS, Marcel.
( 2003). "Ensaio sobre a Dádiva: forma e razão da troca nas sociedades arcaica", in: Sociologia e
Antropologia


MALINOWSKI, Bronislaw.
(1978) Os Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Brasil Cultural.


POLANYI, Michael
(1975) [1958]. “The stability of scientific knowledge against experience”, in: MARWICK, M (ed)
Witchcraft & Sorcery. Harmondsworth: Penguin Books.


ZINBERG, Norman.
(1984) Drug, Set, and Setting The Basis for Controlled Intoxicant Use. Cumberland: Yale University Press

Referências relevantes publicadas posteriormente

GROISMAN, Alberto & Marlene Dobkin de Rios.
(2007). “Ayahuasca, the U.S. Supreme Court, and the UDV-U.S.Government case: Culture, Religios and Implications of a Legal Dispute”, in: Winkelman, M. J. & Thomas B. Roberts (eds.). Psychedelic Medicine: New Evidence for Hallucinogenic Substances as Treatments. Preager: Portsmouth.


LABATE, Beatriz C & Wladymir Sena Araújo (eds.).
(2004). O Uso Ritual da Ayahuasca. Campinas: Mercado das Letras/FAPESP.


LABATE, Beatriz C & Sandra Goulart (orgs)
(2005) O Uso Ritual das Plantas de Poder. Campinas, Mercado de Letras/Fapesp, 2005.


MACRAE, Edward J. B. N. ; VIDAL, Sergio M. S.
(2006) "A Resolução 196/96 e a imposição do modelo biomédico na pesquisa social: dilemas éticos e metodológicos do antropólogo pesquisando o uso de substâncias psicoativas".Revista de
Antropologia (São Paulo) , v. 49, p. 645-666.


Referência para citar este texto: GROISMAN, A. Proibições (Im)Possíveis? Um olhar sobre as
Fronteiras Simbólicas entre Texto Jurídico e Concepções Religiosas. Núcleo de Estudos
Interdisciplinares sobre Psicoativos – NEIP, 2010. Disponível em www.neip.info

Cientistas fazem carta pró-maconha

São Paulo, quarta-feira, 14 de julho de 2010

Neurocientistas renomados assinam documento em defesa da legalização da droga até para fins “recreativos”

Nota foi motivada pela prisão do baixista da banda de reggae Ponto de Equilibrio, por plantio de maconha

EDUARDO GERAQUE
DE SÃO PAULO

Um grupo de neurocientistas que estão entre os mais renomados do país escreveu uma carta pública para defender a liberalização da maconha não só para uso medicinal, mas para “consumo próprio”.
Assinam a carta nomes como Stevens Rehen, da UFRJ, coautor da primeira linhagem de células tronco no país, e Sidarta Ribeiro, diretor do Instituto de Neurociências de Natal.
Eles falam em nome da SBNeC (Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento), que representa 1.500 pesquisadores.
A motivação do documento foi a prisão -um “equívoco”, diz o texto- do músico Pedro Caetano, baixista da banda de reggae Ponto de Equilíbrio, que ganhou repercussão na internet.
Ele está preso desde o dia 1º sob acusação de tráfico por cultivar dez pés de maconha e oito mudas da planta em casa, em Niterói (RJ).
Segundo o advogado do músico, ele planta a erva para consumo próprio.
A carta o defende dizendo que é “urgente” discutir melhor as leis sobre drogas “para evitar a prisão daqueles usuários que, ao cultivarem a maconha para uso próprio, optam por não mais alimentar o poderio dos traficantes de drogas”.
De acordo com os membros da SBNeC, existe conhecimento científico suficiente para, pelo menos, a liberalização do uso medicinal da maconha no Brasil.
A SBNeC se baseia em estudos que mostram efeitos terapêuticos que poderão, um dia, ajudar no tratamento de doenças como Parkinson.
É uma posição bem diferente da adotada, por exemplo, pela Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (leia ao lado).

EM OUTROS PAÍSES
“O Brasil está atrasado nessa discussão, ao contrário do que ocorre em países como Argentina, México e Portugal”, diz Ribeiro.
Nos vizinhos sul-americanos, por exemplo, é permitido o porte de alguns cigarros de maconha para consumo próprio. O fumo, entretanto, não pode ocorrer na rua.
Diferentemente de quase todos os países, onde a maconha é banida, outros como a Holanda e a Espanha permitem o consumo e o cultivo para consumo próprio.
“A lei de drogas no Brasil -reformada na última vez em 2006- avançou, mas criou um paradoxo”, diz Ribeiro. “A pena para o usuário baixou, mas ela não permite o cultivo para uso próprio”.
Se a Justiça entender que o músico da Ponto de Equilíbrio é traficante, ele poderá ficar, pelo menos, cinco anos na cadeia. Caso ele seja considerado usuário, deverá prestará serviços sociais por apenas alguns meses.
“Falta uma espécie de manual de instruções desta lei”, afirma Antônio Gonçalves, advogado especialista em filosofia do direito.
A legislação, diz o especialista, não define quem é o traficante e quem é o usuário. Fica tudo para a Justiça definir. “Falta a lei dizer como proceder, para evitar situações como a do músico”.

Ciência Psicodélica no século XXI